Dói-me tudo!!
Sentir dor é para o ser humano sinal de desconforto, de que algo está mal no nosso corpo e que temos que rapidamente nos livrar dela. No entanto, a nossa capacidade de sentir dor é na realidade um excelente sistema de alarme e de protecção, e mais importante do que desligar este alarme é percebermos o que o fez ter a necessidade de se activar.
Para que isso aconteça é importante avaliarmos a história daquela dor, compreender as emoções, crenças e comportamentos associados; quando falamos em dor crónica (dor que se mantém há mais de 3 meses) o mais importante é descobrir porque é que ela se mantém no tempo e retira diariamente qualidade de vida à pessoa.
A forma como cada um de nós percepciona a dor é única, isto quer dizer que, se duas pessoas foram diagnosticadas com um problema semelhante, ambas poderão sentir dor, mas com características diferentes como por exemplo, na intensidade da dor (para uma pessoa pode ser muito intensa como uma facada e que a impede de se movimentar e para a outra ser uma dor tolerável e não limitativa), no comportamento da dor (uma pessoa pode sentir mais dor quando realiza movimento e a outra pode sentir mais dor quando repousa) ou na forma de gerir a dor (uma pessoa pode ficar mais irritada e sem paciência para nada e a outra pode ficar mais triste e incompreendida).
Assim, com tanta imprevisibilidade e variáveis a ter em conta não é de admirar que cada vez mais pessoas procurem a Fisioterapia para tratar a sua dor crónica. Exige-se então ao fisioterapeuta que consiga fazer uma avaliação o mais abrangente e personalizada possível, dando sempre espaço ao paciente para ser um agente activo na sua reabilitação.
O nosso sistema de alarme está ligado sempre 24 horas por dia e quando o cérebro recebe informações do nosso corpo de que existe algum “bloqueio”, restrição, limitação, adaptação (vários seriam os termos que podemos usar), ele vai ter que tomar uma atitude para resolver esse problema, então, várias zonas do nosso cérebro (zonas da dor) trabalham em conjunto e originam a dor, para nos alertar. Então, ao invés de querermos desligar logo o alarme da dor, o melhor é perceber o que nos fez chegar a este ponto e solucionarmos o problema pela sua origem. Por exemplo, cada vez mais existem queixas devido às posturas mantidas durante um dia de trabalho. A solução nestes casos pode passar, entre outras coisas, por dar uma maior variabilidade de movimento àquela pessoa para que o seu sistema de alarme se volte a silenciar. Agora é fácil entender que sentir dor é uma coisa boa! Significa que o nosso sistema nervoso está atento a tudo o que nos influencia e nos protege.
Existem também situações mais complexas, em que o nosso sistema de dor se activa, porém, ele permanece ligado ao longo do tempo e deixa de representar com veracidade o estado actual do nosso corpo pois ele fica sensibilizado e com esta continuidade vários sistemas começam a ser alterados, como o sistema imunitário, o sistema endócrino, o sistema nervoso simpático e parassimpático. Por isso é que trabalhar na dor é um processo delicado e cada pessoa tem o seu processo de gestão de dor que deve ser respeitado. Cabe aos profissionais de saúde educar o paciente o melhor possível sobre a sua situação e contribuir com estratégias que ajudem o paciente a controlar a sua dor
Existem muitos mitos associados à dor, como por exemplo, se uma dor é muito intensa é significado que existe uma grande lesão em alguma estrutura (osso, músculo, tendão, ligamento, articulação,…). No entanto isso não é necessariamente verdade pois através de vários estudos da cérebro (estudos com ressonâncias magnéticas ao nosso sistema nevoso central) foi possível observar que pacientes com dores muito intensas não apresentavam alterações tecidulares significativas, assim como o contrário pode acontecer, casos em que pacientes foram diagnosticados com lesões na coluna vertebral (hérnias ou protusões discais) e que nunca experienciaram dor.
Outra mentira associada à dor, é que a dor física não se relaciona com as emoções. Tanto que durante muito tempo, os fisioterapeutas olhavam para as pessoas como o local da sua dor, por exemplo, uma pessoa que apresentava dor no ombro direito seria apenas avaliada nesse local e tratada apenas ao ombro direito. Hoje em dia está provado que o contexto em que a dor surge é demasiado importante, e por contexto entende-se cultura, qualidade de vida, sistema emocional, sistema de apoio, etc. Portanto, é frequente que num tratamento de Fisioterapia em que o paciente refira dor no ombro direito, o fisioterapeuta sinta a necessidade de avaliar por exemplo: a sua cervical, a sua qualidade do sono, o seu estado de hidratação, os seus níveis de stress actuais, lesões antigas, conflitos emocionais, entre muitos outros. Só depois de termos esta oportunidade de avaliar os diversos parâmetros poderemos traçar qual a estratégia para ajudar a pessoa e qual o plano de tratamento mais adequado para aquela pessoa.
“Estou com dor, não me posso mexer! “ Esta será uma frase que pode já ter sido dita por si! É um facto muito frequente na boca de quem sofre alguma dor de carácter muscular ou articular. No entanto a ciência mostra-nos os contrário e que não passa de um mito! As articulações e os músculos gostam de movimento e é através deste que se regeneram e cicatrizam, assim, o papel do fisioterapeuta será o de lhe permitir voltar a mexer-se o mais rápido possível, e assim que isto é explicado aos pacientes, o medo de se mexerem diminui e damos início ao processo de cicatrização com o tal papel activo do paciente.
Um papel activo por parte de quem sofre é muito importante, desde o momento em que deve querer aprender mais sobre a sua dor e o seu corpo, sobre os factores que fazem o seu alarme disparar, quais os movimentos que pode fazer para melhorar mais rapidamente e que tratamentos existem disponíveis para se recuperar mais rapidamente.
Se necessitar de ajuda e quiser participar no seu processo de reabilitação, procure um especialista.
Fisioterapeuta Ana Guedes